segunda-feira, julho 23, 2007

Depositei nas mãos dele a flor mais bela, cultivada durante anos para ser colhida. O castelo que construí resiste ao tempo tempestuoso, à distância ventando violenta. A base parece ruir, mas resiste. A calmaria virá, a primavera voltará doce e perfumada. O olhar atrás dos óculos escuros diz muito embora congele silenciosamente meu corpo todo que treme dos pés a cabeça quando ele toca. A indiferença impõe os metros de distância que nos separam a centímetros fazendo o inverno mais insupotável, agora neva, as entranhas congelam, as lágrimas saem pretrificadas, quase imperceptíveis na geada constante.
À espera da primavera os dias rastejam inconscientes do estrago infligido ao castelo de areia que construí e que ele derruba com tanto prazer e suor a cada toque lascivo. Eu preferi o vilão ao príncipe, devo suportar as consequências. O vândalo reaparece inesperadamente, como na primeira vez, se instala grosseiramente e ainda debocha da minha fragilidade. Ele goza das minhas convicções e se vai. Mas fazer o quê se ele traz a vida em si, se torna o castelo em festa e afasta o inverno solitário.
Eu sorvo a fonte até o último gole, me preparando para hibernar quando ele se for, tento resistir às mentiras que impõe tão bem camufladas em sua pele de leite e mel. Ele sempre traz delicadamente o sol e faz renascer todo o desejo congelado pelo tempo, me queima a pele e aplica a conta gotas a vida esperada durante toda uma estação cruel.
Ao chegar, anjo melífluo encanta desmesuradamente, me faz morrer em frente ao mar calmo. Ao sair, carrasco áspero castiga desmedidamente ao tom de uma voz amarga vinda de não sei que abismo para lançar de vez às masmorras, sabendo que só ele é capaz de abrir os cadeados das correntes impostas.
É frio e escuro. Ele voltará, sempre volta.